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sábado, 7 de abril de 2012

SANTA NEM UMA SEMANA

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As primeiras semanas santas da minha vida, eu ainda criança em Tabatinga, ficava silenciosamente intrigada com o mistério que envolvia o fato de todas as imagens de santos da igreja, estarem cobertos por um cetim roxo. O que estava acontecendo? O que era aquilo?
Quando eu era criança, certas coisas, nem eram para se perguntar.
Se ninguem havia tido o que era, devia ser porque eu não tinha que saber…
Aí no catecismo, desfez se o mistério.
Começava com a quarta feira de cinzas, onde logo na missa de manhã tinha que ir a igreja onde as cinzas depositadas na cabeça pelo padre se confundiam com os confetes, nos cabelos cacheados.
Na quarta feira, carne nem pensar.
Em toda quaresma, as quartas e sextas feiras, só peixe, sardinha, ovos, legumes.
Os açouques nem abriam.
Era uma regra predominante. Em todas as casas, todas as famílias.
E em toda a quaresma, os santos cobertos pelo cetim roxo.
Ficava uma sensação de luto no ar.
Ninguém casava, ninguem batizava, nenhum tipo de festa. Era quaresma. Luto.
Na semana santa, havia a missa do“Domingo de Ramos”.
Eu não conseguia disfarçar a euforia na procissão de ramos, quando as pessoas,especialmente as que moravam na roça, traziam os ramos para serem benzidos.
Eles faziam arranjos, em forma de cestas, de laços, folhas entrelaçadas, eu achava tão lindo!
Muitas crianças como eu, só levavam uns raminhos, mas quando o padre os benzia, eu voltava para casa segurando meus ramos bentos, como se fossem a chave da porta do céu .
Na segunda, e terça feiras, nada a acrescentar. A igreja permanecia fechada.
Na quarta feira, “abstecer se de carne,como manda a santa madre igreja.”
Na quinta feira, cerimônia do lava pés.
Eu não entendia, acho que nem me interessava pelo aspecto religioso, eu ficava fascinada com o ritual teatral da cerimônia.
Na sexta feira, as rádios do interior não funcionavam, e os rádios não eram ligados. Silencio total.
Não era permitido cantarolar, assobiar, nem rir muito, nem brincar, nem brigar com os irmãos.
Tudo quieto, comedido, as vezes eu me esquecia, falava ou cantava alto, minha mãe logo corrigia: Silencio: hoje não pode.
Não que minha casa fosse de pessoas muito religiosas. Era assim que tinha que ser.
Na sexta feira o almoço era bacalhau. Mas com sentido religioso.
Sem espírito gastronômico. Receita básica: azeite, molho tomate, cebolas, batatas e azeitonas.
Ao anoitecer, na procissão, a cidade inteira, o pessoal da roça comparecia em massa.
Haviam
pessoas que vinham para cidade, só uma vez por ano, nesse dia. Mais importante que o Natal.
O momento em que a VERONICA cantava, enxugando o rosto de CRISTO, era para mim o momento mais esperado. O mistério. A Verônica trazia o rosto coberto, a gente nunca sabia quem era. Sábado a ressurreiçaõ, no domingo de páscoa, missa com roupa nova, á principio não havia o ritual dos ovos de páscoa.
No interior, eles foram chegando devagar.
A escola ensinava a música “Coelhinho da Páscoa que trazes pra mim? “
A primeira vez que os ovos de páscoa apareceram em casa, eu devia ter 11 anos. Na venda onde meus pais tinham conta apareceram os ovos, eu comprei fiado os menores, um para cada irmão, fiz um arranjo com papeis coloridos picados numa travessa coloquei os ovos, fiz surpresa para eles . Primeiros ovos, primeiros chocolates. Aí se fez a Páscoa ...
À partir dos meus 15 anos o sentido religioso da quaresma foi se perdendo, mas acho que não só para mim.
Hoje o peixe e bacalhau representam mais variedades gastronômicas. O chocolate é só o bom e velho chocolate.
Músicas, festas,TV, tudo normal. A quaresma nem se nota o ínicio e o fim.
Nenhuma crítica as mudanças. Só constatação.
A fila anda. As coisas mudam, até as maiores tradições, vão sofrendo alterações. Mas minhas lembranças, minhas histórias, estão aí. São meus olhos atentos para as mudanças.
Observações.

4 comentários:

  1. verdade picida,hoje ninguem mais respeita nada,fico triste com isso.bjos samia

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  2. Picidinha, eu assinaria seu post, tal a semelhança de nossas recordações...
    O que era assistir ao já roto e velho rolo do filme "A Vida de Cristo" e se emocionar sempre? O que era malhar o Judas com a molecada? E, no domingo, procurar com os irmãos os ovinhos escondidos pela mãe?

    Ai, ai...

    Beijocas!

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  3. Picida,
    Sabe que não sou religiosa, mas não tenho nada contra Jesus rs - meu problema é como usam a imagem e o nome dele. Gostaria mesmo de ter informações históricas confiáveis sobre a vida dele.
    Da Semana Santa, uma referência mórbida...lembro muito da minha madrinha me levando para ver Jesus, na missa: vem filhinha, vem ve o Jesus morto...Chegando no altar, tinha uma estátua de Jesus em uma mesa, como se estivesse em um velório sem caixão. Muito impacto para uma criança, né não?
    Legal mesmo eram os épicos bíblicos do cinema, que passam até hoje. Adoro Ben Hur, Qvo Vadis e Rei dos Reis.
    Bjocas

    ps - tira estas letrinhas irritantes dos comentários!!! kkkkkkkkkk

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  4. Picida, vc lembra quem eram as verônicas da nossa infância? Osmar Malaspina

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